Antes, durante e depois

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Antes, durante e depois

Há um provérbio que é dito num filme para crianças mas que ressoa recorrentemente no meu pensamento: “o ontem é história, o amanhã é mistério e o hoje é uma dádiva, por isso é que se chama presente.” Este provérbio, que desconheço se é de origem cultural ou se foi criado propositadamente para o filme, não é definitivamente para crianças. Quando somos crianças temos ainda muito pouca história e raramente refletimos sobre os mistérios do amanhã. Quando somos crianças focamo-nos sobretudo no presente.

Presente esse que não é ainda uma dádiva mas sim uma constante surpresa. E essa surpresa provém de dois fatores que caracterizam os nossos primeiros anos de vida: a ingenuidade e a curiosidade. Quando crescemos, a perda da ingenuidade provocada pela experiência do passado, contribui para que a nossa percepção do mundo seja mais consciente e, por vezes, desconfiada, levando-nos a associar as surpresas do presente às suas respetivas consequências. E aí sim, aprendemos o que é o mistério do amanhã. Esta consciencialização temporal costuma provocar grandes desafios psicológicos e é talvez por isso que o provérbio que mencionei tenha tocado a tanta gentes.

Na busca pelo equilíbrio, há quem se deixe condicionar pelo peso do passado, há quem se deixe levar pela ansiedade do futuro e há quem decida viver sem qualquer critério para aproveitar o presente como se não houvesse amanhã. No âmbito do erotismo e da sexualidade, estas formas de encarar a realidade transpõem-se muitas vezes para a forma como se encara o sexo e o prazer. Mesmo quando se definiu chamar “preliminares” às interações sexuais que vêm antes da penetração e criou uma linha sequencial de resposta sexual que termina numa “resolução” após o orgasmo, nitidamente assumiu uma linha temporal de antes, durante e depois.

Mas, ao contrário das corridas que têm uma meta, o objetivo da interação sexual não deve ser chegar mais longe ou mais rápido, mas sim correr por gosto. E quem corre por gosto, como diz um outro provérbio, não cansa. Assim, apesar da lição sobre o presente ser muito interessante, não em termos temporais ou de algo que recebemos, mas sim sobre a capacidade de nos darmos a nós ao presente, de sermos nós presentes, de sermos nós a oferta ao mundo que nos rodeia, na interação sexual, a linha temporal do prazer é muito mais dinâmica do que linear.

Assim como os preliminares podem ser feitos em qualquer altura da interação sexual, também o orgasmo pode ser apenas o início ou pode até nem haver orgasmo nem um fim anunciado. O prazer deve ser intemporal. O que conta não são os segundos nem os minutos, nem quantas vezes se faz ou se deixa de fazer. O que conta é a vontade. A vontade de querer, de fazer, de desfrutar e, acima de tudo, a vontade de respeitar o passado, o presente e o futuro de quem nos quer e de quem nós queremos.

 

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