O poder do pudor
No geral, a forma como as pessoas vivem a sexualidade é composta sobretudo por duas características principais: uma é o ato de dar e a outra é o ato de receber. Ambas são ações e, portanto, não se trata de se falar em sujeitos passivos e ativos, mas sim em posturas de entrega e aceitação. E esta diferença faz toda a diferença. O ato de entrega e de aceitação pode até ser a mesma ação. Mas vamos por partes.
Como diria Oscar Wilde, “tudo é sobre sexo, excepto o sexo. O sexo é sobre poder”. Desde que os animais começaram a procriar, a interação erótica e sexual é sobretudo um jogo de forças e de poderes. Com formas mais ou menos sedutoras ou violentas na sua concretização, a realidade é que quem dá e quem recebe procura garantir sempre que o que é dado é bem recebido e vice-versa, sendo machos ou fêmeas em qualquer um dos papéis. Esses papéis, aliás, podem até ir-se alternando ao longo da relação sexual e, sobretudo no caso dos humanos, ao longo da relação amorosa.
A procura de prazer erótico e sexual é uma força sempre presente no dia a dia dos seres humanos. Não havendo uma época de acasalamento definida, nem um período de cio demasiadamente notório (apesar de haver algumas reminiscências dessa condição no período fértil da mulher), cada dia é um desafio ao desejo, à vontade e à disponibilidade sexual de cada um.
A procura e a oferta estão constantemente presentes e fazem-se das mais diversas formas, seja em contactos pessoais, na comunicação social, em produtos e serviços disponíveis, em manifestações culturais e artísticas ou, atualmente, na constante renovação de informação nas redes sociais. Essa sobre-estimulação pode inclusivamente criar uma barreira à forma como aceitamos novos estímulos, já que, nestes casos, somos definitivamente passivos perante o que nos rodeia. E assim percebemos a diferença entre passividade e aceitação. No ato de aceitar está também implícito o ato de não aceitar, daí a aceitação ativa ser tão mais valiosa.
Ver uma oferta nossa ser aceite com entusiasmo é um ato de generosidade afetiva poderosíssima da parte de quem aceita. Significa que o que oferecemos correspondeu efetivamente ao que a pessoas desejava. E essa compreensão do outro, ao ponto de sabermos potenciar as suas expectativas, é talvez o maior segredo para um jogo de poder saudável numa relação. No entanto, na procura deste entendimento mútuo, podem surgir todo o tipo de barreiras, e o pudor é talvez a que abrange mais sentimentos, daí a sua importância para esta questão.
O pudor é uma mistura de medo, vergonha, ansiedade e, acima de tudo, receio de julgamento. E sim, mesmo por razões diferentes, é algo que constrange tanto atos de mulheres como de homens. Mas mais do que uma barreira, o pudor é um sinal. Um sinal que não devemos dar nada sem dar primeiro atenção. Porque a atenção é a base da compreensão e é, só por si, o gesto ambivalente por excelência, porque a atenção é algo que só se tem quando se dá.
Rui Simas
Erotic coach