ELA II | Conto Erótico
Tudo o que ela queria era ser amada. Alguém que a amasse como pensava que merecia. Como pensava que qualquer pessoa merecia. Ela até achava que já tinha conhecido o amor da sua vida, mas perdera-o por terem diferentes visões do que o amor deveria ser. Foi-lhe ensinado que uma relação amorosa era para ser somente entre duas pessoas, até que a morte (ou a traição) as separasse. Nada mais, nada menos. Ele vivia noutra realidade. Era um espírito livre, desapegado, libertino e aluado demais para os pés na terra dela.
Ele queria uma “relação aberta”, com outras pessoas metidas ao barulho, mas aquele barulho nunca foi música para os ouvidos dela. Ele queria que partilhassem prazeres alheios, assegurando sempre que o seu amor não se extinguiria. Mas ela não acreditava ter fé para dar nesse salto. Bastava vê-lo a trocar olhares ou mensagens com alguém alheio e todo o seu corpo se fechava à possibilidade da relação aberta. O seu coração e a sua consciência estavam em desequilibro constante.
Tinha dúvidas de tudo, exceto que o amava. Mas não estava preparada para mais nada. Ele, mesmo com o fim à vista, não cedeu. Depois do último beijo molhado, mas por lágrimas, ainda conseguiram sorrir. E foram de mão dada até ao fim da rua, antes da bifurcação, onde cada um seguiu o seu caminho. Talvez a vida os trouxesse de volta, um dia, mais esclarecidos do rumo a tomar.
Mas por agora, o tempo passara, e ela estava de volta à estaca zero. Não com o coração partido, mas revoltado. Ela já não estava à procura de um amor simples. Ela estava à procura de um amor maior e mais pleno do que o que tinha tido antes. Mas esse desejo estava a ser cada vez mais difícil de concretizar. Por querer muito parecia que o que recebia era sempre pouco. Não havia desafio, estímulo, vontade.
Tudo era previsível, banal, igual. Adivinhava as estratégias, os engates, as intenções e até a qualidade do desempenho dos artistas forasteiros que a tentavam encantar com números de circo. Era tudo parecido com o que ela era antes mas que agora já não era. Tudo exatamente como ela esperava que fosse. E para ela, foi como ver-se a si mesma refletida num espelho antigo.
Talvez, antes do amor que a transformou, ela caísse naquelas armadilhas de sempre, mas apesar de não ter aberto a sua relação, algo na sua mente tinha sido aberto. E agora, como poderia ela transformar a sua vida se procurava algo diferente nos mesmos lugares, com as mesmas pessoas? Já não conseguia estar satisfeita com o romance clássico e sexo puritano. Queria mais. Queria o homem certo para a altura certa, mas parecia impossível encontrá-lo no seu núcleo de amigos e conhecidos. Então decidiu tentar online. Com tanta oferta e tantos algoritmos, certamente encontraria a combinação perfeita.
Escolheu as suas melhores fotos de verão, aplicou uns filtros para parecer mais natural e publicou o seu perfil numa app com fogo posto. E rapidamente começaram a chover homens de todos os lados, idades, cores e feitios, solteiros e casados, tarados e apaixonados, desejavam avidamente aquela que estava no ecrã. Ela estava em êxtase. Finalmente tinha um mundo de pilas a seus pés.
E era tão fácil fazê-los ceder. Bastava um coração no sítio certo ou uma piscadela de olho amarela para lhes sacar as confissões mais íntimas. Eles diziam-lhe tudo, prometiam-lhe tudo e faziam-lhe tudo, só pela possibilidade de um dia estarem perto dela. As juras de amor vinham de todo o mundo. O amor que tanto pedira, era agora em demasia. Mas ela sabia que não era real, que tudo vinha do desejo que criara na mente daqueles homens.
Só que o poder era imensurável e isso excitava-a. Tinha-os onde os queria. E agora ia elevar a fasquia. Então criou um evento online. “Para todos os que me amam”, escreveu, “convido-vos a estarem neste evento com as vossas mentes abertas e as vossas pilas bem duras. Estarei à sua espera”, acrescentou, “pronta para receber todo o vosso amor!”. E assim, no dia marcado, na hora marcada, no local marcado, ela deitou-se numa cama nua, algemou as mãos à cabeceira, e esperou pelos seus fãs num pequeno quarto pouco iluminado.
O tempo parecia ter parado. Da porta do quarto, entreaberta, nenhum som. Ela sentiu como se tivesse saltado para uma piscina vazia. Apesar de molhada, nada. Precisava de ser fodida por centenas de homens de todo o mundo. Precisava de se sentir desejada. Precisava de se sentir amada. Precisava de se sentir viva. Mas, naquele momento, sentia-se como uma prisioneira da sua própria fantasia. Presa a uma cama, perdida, envergonhada, a viver uma fantasia em que só ela acreditava. Subitamente, um toque na porta. Ela sorriu.